AFINAL, QUEM É O RESPONSÁVEL PELO ÔNUS DO AFASTAMENTO COMPULSÓRIO DAS GESTANTES?

Notícias • 18 de Maio de 2021

AFINAL, QUEM É O RESPONSÁVEL PELO ÔNUS DO AFASTAMENTO COMPULSÓRIO DAS GESTANTES?

A publicação da Lei nº 14.151/2021, que dispõe sobre o afastamento da empregada gestante das atividades de trabalho presencial durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, suscitou diversas dúvidas sobre a sua aplicação e os desdobramentos.
O texto normativo da legislação publicada que possui apenas dois artigos, estabelece em seu artigo 1º que: “durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração”.
O parágrafo único do artigo 1º, por seu turno, dispõe que “a empregada afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância”.
Nas circunstâncias onde as atividades inerentes ao trabalho desempenhado pela empregada gestante afastada forem compatíveis com a prática através da modalidade de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância, não há dúvidas de que empregada gestante afastada, que ficará à sua disposição e, portanto, com direito à remuneração custeada pelo próprio empregador.
É razoável entender que o Estado, partir do reconhecimento pelo próprio ente através do dispositivo legal de que a gestação da empregada é uma condição de risco, este atrai para si a responsabilidade e o ônus de proteger referido grupo vulnerável revestindo tal condição de características das modalidades que dão causa ao pagamento do auxílio para incapacidade temporária (doença) pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Nas circunstâncias onde as atividades da empregada gestante forem incompatíveis com a prestação do trabalho à distância, de forma remota, é onde reside grande parte das dúvidas e controvérsia para a aplicação do dispositivo legal publicado.
Inicialmente, as dúvidas recaem sobre a possibilidade de aplicação dos dispositivos apresentados pelas Medidas Provisórias 1045 e 1046/2021, que assim como a Lei 14.151, visam contribuir com a menor circulação de pessoas. Não há no dispositivo vedação a aplicação das medidas, contudo, cumpre destacar que as medidas autorizadas pela MP 1045/2021 carecem de celebração e pactuação de acordo individual ou coletivo entre as partes e dessa forma somente serão aplicáveis mediante concordância da empregada gestante ou da entidade classista profissional. As medidas autorizadas pela MP 1046/2021, à exceção da constituição de banco de horas, não carecem de pactuação e podem ser adotadas unilateralmente pelo empregador, como por exemplo, a antecipação de férias individuais e/ou o aproveitamento e antecipação de feriados.
É possível ainda, como alternativa plausível, mas com algum grau de risco, que os empregadores encaminhem as empregadas gestantes para a obtenção do auxílio para incapacidade temporária junto a Previdência Social , no entanto, mantendo o pagamento da remuneração, para evitar que a empregada fique no limbo previdenciário em um momento de tamanha vulnerabilidade e insegurança jurídica, e aguardem a resposta da perícia médica a ser realizada pelo INSS, que muito provavelmente será negativa.Contudo, constituem fundamento para a adoção de medidas judiciais cabíveis para que o Estado seja declarado o responsável pelo ônus momentaneamente imposto (o que poderá ser feito mediante compensação tributária no futuro).
A referida pretensão está alicerçada com base em dois fundamentos. Em primeiro lugar, com fulcro no artigo 394-A, §3º, da CLT, aplicado por analogia, que ocupa-se do afastamento da empregada gestante por gravidez de risco, sem prejuízo de sua remuneração, das atividades consideradas insalubres. Segundo estipula o texto normativo do referido dispositivo: “quando não for possível que a gestante ou a lactante afastada nos termos do caput deste artigo exerça suas atividades em local salubre na empresa, a hipótese será considerada como gravidez de risco e ensejará a percepção de salário-maternidade, nos termos da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, durante todo o período de afastamento”.
Em segundo lugar, o teor do disposto no artigo 4°, item 8, da Convenção 103 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), estipula que que “em hipótese alguma, deve o empregador ser tido como pessoalmente responsável pelo custo das prestações devidas às mulheres que ele emprega”. Gize-se que as convenções da OIT, por se constuir-se em tratados de direitos humanos, possuem status normativo supralegal. (RE 466343, relator(a): Cezar Peluso, Tribunal Pleno, julgado em 3/12/2008, Repercussão Geral, publicação 5/6/2009)
Como é possível denotar do exposto, em que pese dispor de apenas dois artigos, a inovação legislativa apresentada oferece uma significativa margem interpretativa e, ainda, na lógica de entender que é do Estado o dever do enfrentamento a pandemia, além da proteção previdenciária estendida aos grupos vulneráveis como o das gestantes, como definido pelo próprio Estado a partir da publicação do instrumento normativo.

 Esperamos que esta Lei seja alterada, assumindo a Previdência esse ônus, caso contrário, mais um custo ao empresário, que já sofreu e ainda sofre com os reflexos da pandemia. Ou o Judiciário dê guarida ao empregador, repassando igualmente o custo ao Inss, como assim dispõe o art. 394-A, § 3º, da CLT.

César Romeu Nazario

OAB/RS 17.832

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