Home office: não há legislação sobre o monitoramento digital do funcionário

Notícias • 22 de Setembro de 2025

Home office: não há legislação sobre o monitoramento digital do funcionário

Após demissão de cerca de mil trabalhadores, Itaú diz que monitoramento remoto foi consentido pelos funcionários e acordado com o sindicato.

“Embora a CLT tenha incorporado o teletrabalho em 2017, pela Lei nº 13.467, e, posteriormente, a Lei nº 14.442/2022 tenha regulamentado aspectos como o controle de jornada e fornecimento de equipamentos, não há legislação específica sobre o monitoramento digital”, esclarece Elisa Alonso, advogada trabalhista e sócia do RCA Advogados.

Para Alonso, cabe aos tribunais interpretar os casos relacionados, promovendo uma análise à luz dos princípios constitucionais, como a dignidade da pessoa humana e a inviolabilidade da intimidade, além da própria legislação trabalhista e da LGPD.

A advogada complementa que para assegurar a validade das medidas e reduzir riscos jurídicos, torna-se essencial que a empresa disponha de políticas internas claras, com critérios objetivos de avaliação. Além disso, o monitoramento deve ser concretizado com aviso prévio, levando em conta o princípio da razoabilidade.

Alonso também defende que uma implementação desproporcional abre espaço para questionamentos judiciais, fragilizando a decisão empresarial e expondo a gestão a riscos desnecessários. Feedbacks formais, registros de advertências e comunicações documentadas são provas de boa-fé patronal na opinião da especialista, podendo ser atitudes determinantes em eventuais demandas.

O Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região estima que 1.000 trabalhadores foram desligados do Itaú Unibanco por baixa aderência ao home office na segunda-feira (8). Apesar de o banco destacar que as demissões decorreram de análises profundas realizadas em conjunto com ferramentas de monitoramento on-line durante quatro meses, demitidos do banco ouvidos pelo sindicato afirmam que não receberam qualquer advertência prévia sobre queda na produtividade.

Em nota enviada para a imprensa, o Itaú Unibanco complementa que a média geral de atividade digital da empresa em home office é de cerca de 75%, patamar que a instituição entende como adequado. A companhia complementa que os casos identificados denotam desvio do padrão de comportamento em relação à maioria, o que resulta em quebra de confiança.

Apesar de o banco não ter divulgado nomes de softwares de monitoramento, a Folha de S. Paulo publicou ter encontrado uma publicação da empresa Arctica Tecnologia de agosto de 2025 — responsável pela comercialização do software xOne Cloud — na qual citava um case de uma funcionária do Itaú. A publicação, no entanto, foi editada e não cita mais o banco.

Com 97 mil funcionários distribuídos em mais de 18 países, o Itaú complementa que a decisão faz parte de um processo de gestão responsável que tem como objetivo “preservar a cultura e a relação de confiança” que tem com clientes, funcionários e a sociedade.

Em nota enviada ao Valor, a companhia detalha que o monitoramento adotado não considera exclusivamente o uso de mouse ou teclado como métricas de aderência digital, analisando, assim, atividade digital real dos softwares licenciados para uso corporativo, inclusive chamadas em vídeo, mensageria, cursos a distância e pacote Office. O posicionamento inclui que as métricas de atividade digital consideraram, para além do almoço, 1 hora e 45 minutos de pausas diárias.

A organização ainda compartilha que a vigilância remota foi consentida pelos funcionários e acordada com o sindicato. “O monitoramento das atividades digitais dos colaboradores do Itaú Unibanco está respaldado por suas diversas políticas internas e assinadas por seus colaboradores não apenas em seus contratos de trabalho, como também na retirada de equipamentos corporativos, além de termos explicitamente assinados, como: Política de Monitoração de Segurança no Uso de Recursos Eletrônicos […]”, declara o Itaú, em nota.

O que é produtividade, afinal?

Na percepção de Sylvia Hartmann, pesquisadora sobre trabalho flexível e fundadora da consultoria Remota, esse tipo de monitoramento, das atividades digitais, quase nunca mede performance de verdade. “Ele captura indícios de atividade, mas não qualidade de entrega”, avalia. Para ela, performance exige avaliação de objetivos, impacto no cliente, qualidade da solução e colaboração no time, atributos que dificilmente aparecem em gráficos de mouse ou teclado.

“Quem precisa avaliar performance, dar feedback e desenvolver pessoas é o gestor”, diz Sylvia Hartmann.

Companhias como 3M, Heineken, iFood, Mercado Pago, Visa e Vivo foram convidadas pelo Valor a compartilharem seus métodos de acompanhamento da produtividade dos funcionários que exercem suas funções on-line, mas não comentaram o assunto.

A pesquisadora elabora que quando a empresa confunde atividade com resultado, ela cria uma falsa sensação de controle e perde o que realmente importa: o engajamento, a inovação e o valor agregado. Ainda para Hartmann, o maior malefício da prática recai sobre a cultura. “Monitoramento excessivo sinaliza ‘não confiamos em você’, e gera medo. Controle em excesso não constrói autonomia, só estimula a criatividade para burlar as regras”, defende.

Frederico Giuntini, diretor de performance na Foundever Brasil, empresa global especializada em experiência do consumidor com mais de 150.000 funcionários distribuídos em 45 países, explica que na companhia os empregados passam por um período de estabilização de métricas para que possam trabalhar de casa. Logo após a contratação, o teste é realizado e serve para garantir que o empregado tenha a mesma produtividade em casa e no escritório.

“Fazemos uma cartilha baseada nos indicadores das operações, em que o colaborador deve atingir métricas de forma reincidente”, compartilha Giuntini. O diretor acrescenta que o trabalhador deve cumprir os parâmetros por três meses antes de conquistar o home office.

Em determinadas operações de trabalho, exemplifica o executivo, é possível prover todo o suporte para um funcionário remoto e acessar a tela do trabalhador para ver o que está sendo feito em tempo real. Além disso, Giuntini acrescenta que a companhia conta com dois tipos de sinalização. “A ‘flag amarela’ vai me trazer que o colaborador está em um site que pode estar relacionado [ou não com sua atribuições], como o Google ou algo nesse sentido. Um site que me der uma ‘flag vermelha’ realmente é inapropriado. Isso eu consigo monitorar em tempo real”, destaca.

Ainda para o especialista, o monitoramento aumentou a produtividade e fortaleceu a confiança. “A partir do momento que estou monitorando e acompanhando, sei que [o funcionário] está tendo realmente uma produção em prol da empresa. Para o colaborador, também é uma forma de receber feedback, seja ele positivo ou negativo, e de que tenha um trabalho sendo assistido”, opina. “Desde a pandemia, é uma operação que não me dá nem 1% de turnover.”.

Na experiência de Paulo Castello, fundador da Fhinck, startup de inteligência de dados, criou-se uma cultura de demonização do empresariado no Brasil que deve ser combatida. “Uma companhia que desliga pessoas que não estão produzindo, que não estavam demonstrando engajamento, agora tornou-se ilegal”, satiriza.

Ainda na percepção de Castello, com a era dos dados as empresas que alcançaram a maturidade digital conseguem fazer “mais com menos”, saem da opinião para entender que rumo a empresa está indo e o risco que corre. Ele acrescenta que quase não se fala sobre a “dureza que é para o empresariado brasileiro”, como no aumento anual sobre a folha de pagamento.

“Então, em um país onde tem tanta ineficiência, você tem que correr atrás de eficiência operacional, de redução de custo, de automação, de melhoria de processo, porque a inflação mata a gente”, lamenta.

Fonte: Valor Econômico

César Romeu Nazario 

OAB/RS 17.832

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