A Portaria 604/19 e sua aplicabilidade nas relações de trabalho

Notícias • 21 de Outubro de 2019

A Portaria 604/19 e sua aplicabilidade nas relações de trabalho

A legislação trabalhista, apesar de algumas atualizações implementadas com o passar dos anos, ainda mantém prevalência em seu texto normas concebidas na longínqua década de 1940. No que se refere ao trabalho em domingos e feriados a legislação pouco avançou, basta ver que havia autorização nos serviços de comunicações e publicidade, só para empresas de “comunicação telegráfica”, “radiotelegráfica”, “telefônica” e de “radiodifusão” e nenhuma menção para atividades relacionadas à tecnologia da informação, ou ainda anúncios em bondes e outros veículos, ou seja, atividades há muito em desuso.

O único setor que se mantém de forma relativamente contemporânea é o comércio em geral, em razão da publicação da Lei nº 10.101/2000, que autoriza o trabalho aos domingos e feriados, ressalvadas as restrições eventualmente estabelecidas na legislação municipal e, em relação aos feriados, desde que autorizados em normas coletivas de trabalho negociadas entre as entidades classistas.

Sobrevém que, no último dia 18 de junho, o Governo através da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho editou uma nova portaria, de nº 604/19, ampliando a lista de atividades autorizadas permanentemente para o trabalho aos domingos e feriados. A atualização, porém, não foi significativa.

No que se refere especificamente ao comércio, a autorização permanente dada pela redação da nova portaria foi ampla e genérica: “comércio em geral”. No entanto, para estas atividades já havia, como descrito anteriormente, disposto normativo através de lei, que condiciona o trabalho aos domingos à observância do estabelecido na legislação municipal e o trabalho em feriados à autorização em norma coletiva, o que pela amplitude tende a suscitar conflitos.

A Lei 10.101/00, por exemplo, não só é hierarquicamente superior à Portaria Ministerial, como também mais específica e sua edição é mais recente que a lei que delega ao Poder Executivo os poderes para regulamentar a matéria; a par disso, há a competência legislativa no âmbito dos municípios para disciplinar o funcionamento do comércio.

A Portaria editada portanto, pouca inovação apresenta para um segmento de tamanha amplitude e complexidade, e o texto apresentado de forma ampla e genérica traz consigo insegurança jurídica quanto à aplicabilidade no cotidiano das relações de trabalho.

Para as atividades empresariais não enquadradas neste rol taxativo editado pelo Poder Executivo através da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, há a faculdade de requerimento para obtenção de autorização específica e transitória, o que, é possível através da celebração de acordo coletivo de trabalho específico, firmado junto ao sindicato dos empregados — conforme portaria ainda vigente do extinto Ministério do Trabalho, de nº 945/2015.

A negociação coletiva, aliás, se sobrepõe nesta matéria, dada a prevalência sobre a lei, estipulada pela Constituição Federal e enfatizada pela recente reforma trabalhista. Contudo, importante observar que esta possibilidade, produz efeitos para deliberações em dois sentidos, ou seja, tanto para referendar o trabalho aos domingos e feriados, como vetá-lo. Portanto, mesmo nas atividades  que dispõe de autorização permanente, o trabalho aos domingos e feriados ficará vedado se a negociação coletiva assim estipular.

Por derradeiro, as questões relacionadas a exigências técnicas e conveniência pública, relativas ao funcionamento, contínuo ou não, das atividades empresariais, tem seu principal espectro no âmbito da negociação coletiva — método de solução de conflitos —, o tratamento da questão apenas no âmbito legislativo muito pouco contribui para o atendimento as necessidades trabalhistas para a solução da demanda.

Anesio Bohn

OAB/RS 116.475

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