Possíveis atos antissindicais na determinação de contribuição sindical

Notícias • 19 de Março de 2018

Possíveis atos antissindicais na determinação de contribuição sindical

Não têm sido poucas as notícias sobre as imposições de retenção, neste mês de março, da contribuição sindical, quer por (i) decisões judiciais que pretendem obrigar as empresas ao desconto nos salários dos seus empregados em atenção a ações ajuizadas por sindicatos com o propósito de manter obrigatório o recolhimento de contribuição sindical; ou (ii) por assembleias organizadas pelos sindicatos profissionais cujos participantes teriam aprovado os descontos no salário inclusive para não associados.

É tema que merece cautela sob pena de se perpetuarem as incoerências quando se trata de direito coletivo do trabalho.

Primeiro, pelo lado do exercício do direito à liberdade sindical. Parece, no nosso sentir, com todo respeito, que não está sendo observado o direito fundamental da liberdade sindical, assegurado pela Constituição Federal, em seu artigo 8º, que, além de garantir o exercício livre do direito de fundar associações profissionais ou sindicais, estabeleceu a forma pela qual estaria protegido o exercício do direito.

Com efeito, no inciso I, do artigo 8º, o constituinte, tomado pelo rompimento de vícios históricos em que os sindicatos foram órgãos de colaboração do Estado, asseverou com clareza que um dos princípios do exercício pleno do direito à liberdade sindical seria a não intervenção do Estado em questões sindicais e, desta forma, acolheu a base da Convenção 87 da OIT, que trata da liberdade sindical e do direito de sindicalização, cujos artigos 3.1. e 2 dispõe que “as organizações de trabalhadores e de empregadores terão o direito de elaborar seus estatutos e regulamentos administrativos, de eleger livremente seus representantes, de organizar a gestão e a atividade dos mesmos e de formular seu programa de ação. 2. As autoridades públicas deverão abster-se de qualquer intervenção que possa limitar esse direito ou entravar o seu exercício legal” (g.n.).

São corolários, pois, da não intervenção do Estado nos sindicatos a autonomia na organização, na administração, inclusive financeira, e eleição dos representantes retomadas pela Constituição Federal, porquanto o país já se comprometera na Convenção 98, da OIT, ratificada em 1952.

Convém destacar que o exercício de direito à liberdade sindical é de natureza individual cuja manifestação é exteriorizada de modo coletivo pelo interesse de formar ou, de modo individual, de não formar sindicatos e de não participar de sindicatos.

Qualquer ato do empregador ou do Estado que tenha por objetivo alterar as garantias desse direito fundamental pode ser considerado como antissindical porque obsta seu pleno exercício.

Nesse sentido, a Convenção 98 da OIT proíbe os atos de ingerência considerados como tais “medidas destinadas a provocar a criação de organizações de trabalhadores dominadas por um empregador ou uma organização de empregadores, ou a manter organizações de trabalhadores por outros meios financeiros, com o fim de colocar essas organizações sob o controle de um empregador ou de uma organização de empregadores” (artigo 2.2.).

São considerados atos antissindicais ou práticas antissindicais aqueles que buscam prejudicar o trabalhador ao exercício livre da titularidade do direito sindical. Trata-se, portanto, da proteção ao exercício do direito à liberdade sindical, e, desta feita, considerando o caráter facultativo da contribuição sindical, não poderia o empregador servir de instrumento arrecadador do sindicato profissional e, por essa via, tomar conhecimento das opções políticas de seus empregados. Caso assim o faça, o ato do empregador estaria sujeito a sofrer sanções inclusive por violação ao exercício da liberdade sindical.

Segundo, pelo aspecto tributário. Muito se diz que a contribuição sindical é de natureza fiscal e que somente poderia ser alterada ou suprimida por lei complementar, conforme o artigo 149 da Constituição Federal. Curiosamente, as decisões que impõem a obrigação de retenção limitam-se ao percentual de rateio da CLT de 60% ao sindicato, conforme pedido dos autores, excluindo os outros entes do sistema confederativo da organização sindical, federações e confederações.

Todavia, apenas para não esquecer, a Lei 11.648, de 31 de março de 2008, que criou as centrais sindicais, destinou 10% dos 20% que eram encaminhados ao MTE, para o custeio das centrais, remetendo, no artigo 6º, ao Tribunal de Contas o controle dos recursos. Esse é um exemplo de que não se aplicaria a hipótese de lei complementar porque pôde, naquele momento, a lei ordinária alterar o conteúdo de rateio para entidade que não se encontra amparada na estrutura e organização sindical. Submetida a lei à sanção presidencial, o artigo recebeu veto (Mensagem 139, de 31 de março de 2008), com fundamento em que “a Constituição veda ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical, em face o princípio da autonomia sindical, o qual sustenta a garantia de autogestão às organizações associativas e sindicais”.

Desse modo, juridicamente e em respeito ao exercício da liberdade sindical, o empregador não estaria obrigado a consultar seus empregados, cujo silêncio representa oposição à contribuição sindical. A maneira pela qual o empregador pergunta ou pesquisa junto aos seus trabalhadores poderá ensejar ato antissindical porquanto se trata de assunto de conteúdo político cujo interesse é exclusivo e restrito ao sindicato.

Não se trata de ser contra custeio sindical nem de negação da importância do papel dos sindicatos para as relações coletivas de trabalho. São reflexões que neste momento tormentoso da organização sindical merecem considerações, sob pena de se perder a coerência jurídica com o que se defendeu no passado e a conveniência política do presente.

 é advogado e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e da Fundação Getulio Vargas.

Fonte:Revista Consultor Jurídico

Veja mais publicações

Notícias Quitação das férias no início do período não gera obrigação de pagamento em dobro
16 de Março de 2021

Quitação das férias no início do período não gera obrigação de pagamento em dobro

Para a maioria do TST, o atraso, considerado ínfimo, não causa prejuízo ao trabalhador. 16/03/21 – O Pleno do Tribunal Superior do Trabalho...

Leia mais
Notícias STF decide que norma coletiva que restringe direito trabalhista é constitucional
03 de Junho de 2022

STF decide que norma coletiva que restringe direito trabalhista é constitucional

O Tribunal observou, contudo, que a redução de direitos por acordos coletivos deve respeitar as garantias constitucionalmente asseguradas aos...

Leia mais
Notícias Empresas se preparam para regras de cálculo das multas da LGPD
04 de Novembro de 2022

Empresas se preparam para regras de cálculo das multas da LGPD

Governança, compliance e bancas especializadas checam proteção a dados Quatro anos após a publicação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), ainda...

Leia mais

Assine a nossa newsletter e receba direto no seu e-mail nossas novidades.

Contato

Para enviar uma mensagem, preencha o formulário ao lado. Se você preferir, mande um e-mail para:

contato@nazarioadvogados.com.br

51 99102-4836

51 3594-6682