Retrocesso nas relações de trabalho e na economia

Notícias • 24 de Fevereiro de 2023

Retrocesso nas relações de trabalho e na economia

A depender da decisão do STF as demissões ficarão restritas aos casos de justa causa já previstos no artigo 482 da CLT

Uma dúvida trouxe alvoroço para o mundo jurídico nesse início de ano: quais os reflexos de eventual decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que determine a aplicação, no Brasil, da Convenção nº 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que limita as hipóteses de rescisão do contrato de trabalho pelo empregador?

Tal discussão se dá em razão do iminente julgamento, pelo STF, da ADI nº 1625/1997, movida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG) que busca a declaração da inconstitucionalidade da denúncia feita unilateralmente pelo Presidente da República através do Decreto 2.100/1996; e da ADC nº 39/2015, movida pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) que, ao contrário da CONTAG, busca a declaração da constitucionalidade da mencionada denúncia.

A depender da decisão do STF as demissões ficarão restritas aos casos de justa causa já previstos no artigo 482 da CLT

A depender da decisão do STF as demissões ficarão restritas aos casos de justa causa já previstos no artigo 482 da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e aos poucos casos previstos na Convenção 158: (i) comportamento e desempenho inadequados do empregado e (ii) necessidades técnicas, econômicas ou estruturais de funcionamento da empresa, mesmo assim, as demissões serão condicionadas a um procedimento de comprovação por parte do empregador para que sejam validadas. Tal limitação, se implementada, trará insegurança jurídica e fragilizará a imagem do Brasil no mercado internacional e fará o país perder competitividade.

Cabe lembrar que no Brasil a dispensa sem justa causa já é desestimulada, pois a lei obriga o empresário a pagar ao empregado o valor correspondente a 40% do montante de depósitos do FGTS, realizados ao longo do pacto laboral, bem como conceder-lhe aviso prévio, de 30 a 90 dias. Se de fato a Convenção nº 158 da OIT entrar em vigor o país enfrentará problemas de empregabilidade, o empresário perderá a liberdade de contratar e dispensar empregados, aumentará o emprego informal e serão impactadas as vagas de emprego para jovens ou para aqueles que necessitem se recolocar no mercado de trabalho.

Ainda, com esse novo cenário, os conflitos trabalhistas aumentarão exponencialmente nas relações de trabalho inflando o Poder Judiciário com demandas para análise da adequação legal da justificativa para a demissão.

Neste ponto, importante esclarecer que o número de demandas trabalhistas no país é um dos maiores no mundo, sendo certo que no último relatório analítico da “Justiça em Números 2022”, apesar de indicar uma redução do número de demandas, demonstra que a Justiça do Trabalho recebe um número gigantesco de novas demandas, muito acima dos padrões interncionais.

O temor quanto à Convenção nº 158 da OIT é a forma conflituosa para realização de demissões, o que certamente aumentará consideravelmente o número atual de demandas judiciais, agravando uma situação detectada pelo citado relatório que aponta que na Justiça do Trabalho há uma concentração no assunto “rescisão do contrato de trabalho” – o maior quantitativo de casos novos do poder judiciario.

O acesso ao Judiciário trabalhista, em seus 24 Tribunais Regionais e no TST, acaba sendo estimulado pela ausência de liberdade entre empregado e empregador para resolução dos seus conflitos, ponto este que foi mitigado com algumas medidas em vigor desde as modificações no texto da CLT em 2017, mas que podem ficar ameaçadas com a decisão a respeito da limitação quanto às possibilidades de dispensa.

Ratificar a Convenção nº 158 da OIT, o que, diga-se, foi realizado em sua maioria por países subdesenvolvidos, seria um retrocesso para a relações de trabalho no país, trazendo problemas à economia, ao empregador e àqueles que buscarem recolocação no mercado de trabalho, indo em direção oposta às mudanças recentes na legislação trabalhista que auxiliaram na resolução de conflitos sem a intervenção estatal.

Caso o STF decida que a denúncia não pode ser feita unilateralmente pelo Presidente da República, terá que enfrentar outros temas importantes: (i) haverá efeito modulador para reconhecer a validade do Decreto 2.100/1996 e apenas invalidar as denúncias de tratados internacionais que vierem a ser feitas a partir da publicação da ata da decisão? (ii) ou efeito modulador atingirá parcialmente o Decreto 2.100/1996 validando as demissões praticadas até o julgamento da ADIN 125 e ADC 29, mas tornando o Decreto 2.100/1996 sem validade a partir de então? Tornada sem efeito a denúncia, a Convenção nº 158 será autoaplicável? Ou, não sendo autoaplicável, dependerá de edição de Lei Complementar conforme dispõem os artigos 7º, inciso I, da Constituição da República e artigo 10, inciso I, dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT)? E, ainda, se a Convenção nº 158 for considerada autoaplicável as suas disposições “permanentes” afastarão as condições “provisórias” do artigo 10, inciso I, do ADCT, ou seja, os empregados perderão o direito ao recebimento de indenização de valor equivalente a 40% do saldo da conta do FGTS?

São questões tormentosas que serão enfrentadas pelos operadores do Direito do Trabalho em futuro próximo, a depender da decisão do STF sobre a matéria.

FONTE: VALOR ECONÔMICO
César Romeu Nazario
OAB/RS 17.832

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