Companhias ganham munição para contestar relatório de transparência

Notícias • 19 de Março de 2024

Companhias ganham munição para contestar relatório de transparência

Suposto vazamento de dados do MTE e uma nota do Cade reforçam argumentos de empresas na Justiça contra divulgação de salários

Empresas ganharam mais munição para ir à Justiça contra a divulgação do relatório de transparência salarial em seus sites e redes sociais, conforme imposição pela Lei de Igualdade Salarial (Lei nº 14.611/2023). Na sexta-feira teria ocorrido um suposto vazamento de dados desses relatórios pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). No dia anterior, a publicação de uma nota técnica do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) apontou que a divulgação dessas informações pode trazer riscos concorrenciais às empresas.

Até agora, poucas liminares foram concedidas a favor das companhias, mas uma nova leva de ações judiciais pode ocorrer, com base nos últimos acontecimentos. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Confederação Nacional do Comércio (CNC) já entraram no embate para levar a discussão ao Supremo Tribunal Federal (STF). O pedido de liminar na ação direta de inconstitucionalidade, contudo, ainda será analisado pelo relator, ministro Alexandre de Moraes (ADI 7612).

O suposto vazamento de dados desses relatórios demonstraria, segundo especialistas, o despreparo do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) ao lidar com informações sensíveis, causando riscos às companhias. Para a advogada trabalhista Christiana Fontenelle, sócia do Bichara Advogados, a confusão gerada na sexta-feira, com relação aos relatórios, somada à nota técnica do Cade “trazem mais robustez para a defesa das companhias no Judiciário”.

As companhias com mais de cem funcionários enviaram dados para os relatórios ao MTE até dia 8. Aguardavam o envio do documento pelo órgão na sexta-feira - data prevista oficialmente pelo ministério.

Já no início da manhã, advogados e representantes de RH começaram a receber um link, em grupos de WhastApp, que pedia o CNPJ da empresa para dar acesso ao que supostamente seria o relatório de transparência da empresa. O link ficou instável por algumas horas e foi retirado do ar no início da tarde.

Da maneira como o link foi disponibilizado, segundo o advogado trabalhista, Fabio Medeiros, sócio de Lobo de Rizzo Advogados, qualquer um poderia ter acesso a esses relatórios. “Bastava colocar o CNPJ e baixar”, diz. “Conseguimos, por instantes, ver na tela um relatório, mas não foi possível imprimir”, acrescenta.

Medeiros diz que esse procedimento de divulgação não tem previsão em lei, nem segue os esclarecimentos do MTE na live do YouTube sobre o assunto semanas atrás. Segundo o MTE, essa divulgação seria por download feito apenas pela própria empresa, no dia 15 de março, e a empresa publicaria até o dia 30 de março.

Muitas empresas conseguiram acessar seus relatórios fornecidos pelo link divulgado, segundo a advogada Daniela Yuassa, do Stocche Forbes. “Um dos grandes receios era a divulgação de salários (ainda que em faixas), o que não ocorreu”, diz. Contudo, ela afirma que não se pode considerar que essas versões de relatórios sejam válidas, de forma que ainda há certa expectativa sobre a versão oficial. “Além disso, espera-se que sejam divulgados pelo Portal Emprega Brasil, cujo acesso é exclusivo dos representantes das empresas”, diz

A advogada Marcela Tavares Ortega, do Machado Meyer Advogados, diz que conseguiu acessar as informações sobre o escritório no link enviado. “O formato era igual ao disponibilizado pelo MTE na live. Tinha o salário médio com a comparação de gêneros, o percentual de homens e mulheres, percentual de homens e mulheres negras, dados por grandes grupos de ocupação [como nível superior, técnicos, serviços administrativos e atividades operacionais]” Se a divulgação ocorrida foi de dados reais, o que parecia, segundo ela, há um problema muito grande.

"Transparência irrestrita pode facilitar acordos entre empresas”

— Marcos Veríssimo

Procurada pelo Valor, a assessoria de imprensa do MTE informou, por meio nota, que “somente o relatório que será divulgado a partir do dia 21 de março deve ser considerado como oficial”. Diz também que “informações disseminadas antes desta data, devem ser ignoradas” e que “a área técnica do MTE ainda está trabalhando para consolidar os dados que serão disponibilizados no portal Emprega Brasil na próxima quinta-feira”. Depois disso, empresas terão até dia 31 de março para divulgar os relatórios.

A sensação de risco de danos à concorrência por divulgação de informações sobre os salários é reforçada pela Nota Técnica nº 3, de 2024, do Cade. O parecer foi emitido a pedido da Câmara Brasileira da Economia Digital (Câmara-e.net) sobre o tema. Para a advogada Christiana Fontenelle, a nota reforça a argumentação das empresas nas ações judiciais. Ela afirma já ter proposto cerca de 40 ações na Justiça e outras companhias aguardam a entrega do relatório pelo MTE para entrar com medida judicial.

A nota técnica diz que o relatório de transparência salarial constitui divulgação de informações concorrencialmente sensíveis, que podem facilitar até mesmo a formação de cartéis e a redução de salários.

No documento, o Cade recomenda a suspensão ou cancelamento e posterior revisão dos dispositivos do Decreto nº 11.795/2023 e da Portaria n.º 3.714/2023, do MTE, que determinam a publicação de informações sobre remuneração dos trabalhadores pelas empresas, com o objetivo de alcançar equidade de gênero no local de trabalho.

A nota técnica também afirma que leis que fomentam a igualdade de pagamento entre gêneros na Europa estabelecem que a empresa publique apenas medidas estatísticas de dados agregados (proporções) que revelem a disparidade remuneratória em função do gênero, sem identificar os valores específicos das remunerações.

O ex-conselheiro do Cade e professor de Direito Constitucional da USP, Marcos Veríssimo, sócio do escritório que leva seu nome, destaca que autoridades na área de concorrência do Brasil e de outros países apontam que essa transparência irrestrita pode facilitar acordos entre empresas para que se paguem valores mais baixos de salários. “Mesmo que as empresas não se conversem, esses dados estarão facilmente disponíveis”, diz.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

César Romeu Nazario

OAB/RS 17.832

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